Saiba o ponto de vista de pesquisadores, ativistas, políticos e professores acerca do Dia da Educação e sobre e as mudanças que se fazem necessárias
“Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”. É com essa frase de Paulo Freire que eu proponho o início da nossa reflexão sobre o Dia da Educação, que será comemorado no próximo 28 de abril, e o nosso papel enquanto profissionais da área.
Sem a educação não há a menor possibilidade de transformação, contudo, educar não é só oferecer o acesso a todos, é preciso que, cada vez mais, pensemos na qualidade e na gestão educacional eficiente. Afinal, o Brasil ainda caminha ofegante nos rankings de qualidade da educação no mundo.
De acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), em última avaliação, realizada em 2015, o Brasil ocupa apenas a 59ª posição entre 70 países em leitura. Em matemática e ciências o país está ainda pior, ocupando a 63ª e 65ª posições, respectivamente.
Esse é um resultado muito triste e sobre o qual precisamos refletir no dia de hoje. Afinal, qual é a saída para a educação brasileira?
Em busca pela excelência na educação
Ao especial Sala de Estudos, uma produção da plataforma Quero Bolsa, desenvolvido pela Quero Educação para ouvir quem pensa, quem faz e quem é impactado pela educação, a professora Cláudia Costin, uma das principais especialistas em educação no Brasil e diretora sênior do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV, afirmou que o caminho é a busca pela excelência. “Nós temos que ter altas aspirações para todos os alunos”, pontua.
Contudo, a professora ressalta que para isso é preciso fazer diferente. “A gente só vai construir isso em uma sociedade contemporânea se a gente ousar pensar fora da caixa e testar novos modelos. Nós vivemos na era da quarta revolução industrial, em que a inteligência artificial e automação está substituindo postos de trabalho. Então é fundamental que se pense no desenvolvimento de novas competências e em novos modelos de ensino para que essas competências sejam desenvolvidas”.
Acesso e qualidade
A professora ainda refletiu acerca do paradigma acesso versus qualidade. Segundo ela, na década de 60, a escola pública era referenciada como uma escola de qualidade, contudo, ela era acessível para apenas 40% das crianças. Hoje, temos acesso, mas não temos qualidade e para mudar isso não há outra forma que não repensar o lugar e a formação do professor.
“O processo de transformação precisa ser sistêmico. É necessário trabalhar o elemento mais importante da educação, que é o professor. Você não transforma a educação se não transformar como se preparam os professores na universidade e como se continua esse processo de transformação na formação continuada em serviço”, declara.
Ainda de acordo com a professora, a solução passa pela valorização do profissional, pelo processo de formação, pela exigência na faculdade e por um currículo mais sólido, contemporâneo e alinhado com a prática docente.
Assista a entrevista completa de Cláudia Costin ao jornalista Rui Gonçalves, no especial Sala de Estudos:
Valorização da educação
A deputada Federal, Tabata Amaral, que teve uma das votações mais expressivas do estado de São Paulo é formada em ciências políticas e astrofísica pela Universidade de Harvard.
Tabata compartilha de alguns pontos de vista de Cláudia Costin, como no que diz respeito à qualidade do ensino ser tão importante quanto o acesso a ele. “O Brasil é um país que, de maneira geral, não teve acesso a educação. Meus pais não chegaram a fazer o ensino médio e, no caso do meu pai, ele não chegou a fazer nem o fundamental. Então, como essa população vai entender e valorizar algo que nunca teve? (…) As gerações passadas valorizam muito o acesso, porque não tiveram. Por isso não conseguem entender muito bem a importância da qualidade”, aponta.
A seleção universitária
Apesar de ter sido criada em uma área pobre e periférica da capital paulista, a jovem conseguiu romper diversas barreiras através da educação.
No que diz respeito ao ensino superior, Tabata acredita que o problema já começa na seleção. “O nosso vestibular é muito ruim, quadrado e fechado no sentido em que olha para apenas um tipo de inteligência, um tipo de habilidade, para quem chegou mais longe e não quem correu mais. Eu fui aceita em Harvard porque pude falar dos meus sonhos, enquanto o vestibular brasileiro é um dia, uma prova e uma situação. Não deu certo em algumas faculdades aqui, enquanto deu super certo em seis faculdades americanas, porque a gente não aprendeu a selecionar ainda”, declara.
Políticas educacionais
Ainda de acordo com a deputada é preciso rever as prioridades das nossas pautas políticas para, de fato, podermos transformar a realidade educacional do país. Afinal, segundo ela, hoje, tudo gira em torno das polêmicas e as políticas efetivas são deixadas para segundo plano.
“As coisas que realmente vão virar o ponteiro não são tão polêmicas. Elas não dão tanto ibope e não aparecem na capa do jornal. (…) O desafio do congresso e do Brasil como um todo é entender que a gente vai muito mal em educação e tem muito brasileiro que não entendeu isso ainda. A gente vai mal no nível de não ensinar a ler e escrever e se a gente ficar falando de pautas ideológicas, pautas que viralizam nas redes sociais, mas que não mudam nada, a gente não abre espaço para falar daquilo que importa”, esclarece.
Educação como instrumento de transformação
A trajetória da deputada foi recheada de oportunidades que, segundo ela, são raras e que começaram com algo muito simples e importante, que foi o incentivo de uma professora. Ainda na escola pública, ela a fez participar das olimpíadas de matemática, em que ganhou uma medalha de prata e, com isso, conquistou uma bolsa de estudos em uma escola privada, o que transformou a sua vida.
Entretanto, a deputada faz questão de ressaltar que ela é um ponto fora da curva. “A maior desigualdade está no sonho que as pessoas têm, nas perspectivas de vida. (…) A escola, de fato, coloca as pessoas em pontos de partida diferentes e eu falo isso com muito cuidado, porque as pessoas tendem a achar que eu sou contra a meritocracia, mas eu não sou. Só que no Brasil a gente esquece de uma coisa que é muito importante, que a meritocracia tem uma coisa fundamental para acontecer, que é todo mundo no mesmo ponto de partida e, no Brasil, isso está muito longe de ser verdade”.
Assista a entrevista completa ao Sala de Estudos:
As amarras da educação
O ex-senador, ativista das políticas educacionais e ex-ministro, Cristovam Buarque, acredita que a educação brasileira é prisioneira da cultura de seu povo. “A mente brasileira não dá importância à educação. O professor, por exemplo, não é a principal figura da sociedade e a atividade intelectual, o pensamento não são importantes. Até mesmo quando uma pessoa gasta muito tempo para educar o seu filho, não quer que ele seja educado, quer que ele tenha um bom salário”, esclarece.
Ainda de acordo com o senador, vivemos uma espécie de apartheid na sociedade e uma educação que acompanha tal divisão. “Nós somos um país dividido em duas castas, ricos e pobres, separados, como na África do Sul eram brancos e negros. E a parcela que manda, os ricos, cuidam da educação dos seus filhos e abandona a educação dos pobres. (…) Começa na escola e a partir daí vai para tudo. (…) Temos emprego para ricos e para pobres por causa da escola, que funciona para gerar desigualdade enquanto ela não for igual”, afirma.
Contudo, de acordo com Cristovam, é quase impossível tornar igualitária a educação em municípios tão diferentes e com uma realidade tão desigual como no Brasil. Para ele, a solução passa pela federalização das escolas. “A divisão brasileira entre municípios, estados e nação que faz com que a educação seja uma responsabilidade do município. Nunca vão ter boa escola em quase 6 mil municípios. (…) Não tem outra solução”, acrescenta.
Assista a entrevista completa:
O futuro da educação
Sabemos que não há fórmula mágica ou bala de prata. Em um país com extensões continentais tão grandes e tão diverso, nenhuma solução é simples. Contudo, é necessário que comecemos a olhar para a educação com mais seriedade. Não existe projeto de progresso ou de país que não passe por uma educação de qualidade.
Para além de democratizar o acesso, precisamos repensar nossas políticas, desde a base e nossa gestão educacional. A mudança, na verdade, já está acontecendo.
Na Quero Educação trabalhamos com diversas soluções que tocam a gestão da educação, a democratização do acesso (com bolsas de estudo), o processo de admissão e com a introdução de tecnologia de ponta para uma melhor gestão educacional das instituições de ensino.
Nós acreditamos em uma educação diferente: mais plural, tecnológica e eficiente.
Retomando o pensamento de Paulo Freire que abriu esse texto, não há transformação possível que não passe pela valorização da educação. Então, levemos esse pensamento para os nossos trabalhos e sejamos nós a diferença desde já.
Confira as outras entrevistas do projeto Sala de Aula, como a de, Débora Garofalo, professora brasileira que foi eleita como uma das 10 melhores do mundo pelo Global Teacher Prize:
E do professor nota 10, José Couto Jr que combate a invisibilidade social de seus alunos e comunidade com músicas de Chico Buarque:
Conteúdo produzido em colaboração com o jornalista Rui Gonçalves, responsável pelo projeto Sala de Estudos